Nuno Júdice, O silêncio/Il silenzio
O silêncio
Pego num pedaço de silêncio. Parto-o ao meio,
e vejo saírem de dentro dele as palavras que
ficaram por dizer. Umas, meto-as num frasco
com o álcool da memória, para que se
transformem num licor de remorso; outras,
guardo-as na cabeça para as dizer, um dia,
a quem me perguntar o que significam.
Mas o silêncio de onde as palavras saíram
volta a espalhar-se sobre elas. Bebo o licor
do remorso; e tiro da cabeça as outras palavras
que lá ficaram, até o ruído desaparecer, e só
o silêncio ficar, inteiro, sem nada por dentro.
Il silenzio
Prendo un pezzo di silenzio. Lo spezzo a metà,
e ne vedo fuoriuscire le parole che
restavano da dire. Alcune le metto in un fiasco
con l’alcool della memoria, perché si
trasformino nel liquore del rimorso; altre,
le custodisco in testa per dirle, un giorno,
a chi me ne chiederà il significato.
Ma il silenzio da cui le parole sono uscite
torna a spargersi sopra di loro. Bevo il liquore
del rimorso; ed estraggo dalla testa le altre parole
che vi restavano, finché non svanisce il rumore, e solo
il silenzio rimane, intero, senza nulla all’interno.